Artigo de opinião de José Luís da Costa Sousa.

Chefe de Estado Maior da Polícia Civil da ONU na Jugoslávia (à data)

Das guerras fica, para a História, apenas a versão dos vencedores, que diz serem sempre estes os seus heróis, as suas vítimas e os detentores de todas as razões.

Dos perdedores, diziam os Romanos “aí dos vencidos”, e são sempre eles os culpados e os agressores de todas as guerras, que a História registou.

Andei por algumas guerras, 5 anos nas contra guerrilhas das lusas Áfricas e  descolonizações das ditas, 4 anos nas guerras da ex-Jugoslávia, mais 10 já na paz e Timor; dessas guerras ficaram-me muitas histórias vividas e algum saber de guerras  feito.

Tudo isto para contar uma dessas histórias simples, mera curiosidade ou seriedade, acerca do “modus faciendi” e das “grandiosas razões” que assistem aos “fabricantes profissionais, warmongers” das guerras nos tempos que correm, e que são, ou razões político estratégicas (caso da ex Jugoslávia, incluindo o Kosovo), ou económicas, traduzidas estas no saque dos recursos naturais dos países vítimas (casos do Iraque, Líbia, Síria, Congo e agora a Venezuela, Irão talvez, etc..); outras razões são ficção político mediática.

Ano de 1994, era eu Chefe de Estado Maior da Polícia Civil da ONU, cobrindo esta toda a Croácia, Bósnia e Macedónia; a guerra rugia, forte e fera, na Krajina/ Croácia e na Bósnia; na Macedónia e Kosovo não havia guerra.

O Comissário da Polícia da ONU na Jugoslávia, meu Comandante directo, mandatou-me para ir a Skopje, capital da Macedónia, representá-lo num acto oficial e averiguar um caso de polícia envolvendo um Macedónio; lá fui.

Skopje é uma cidade feita de História, beleza e simplicidade; gostei; ido de Zagreb, de gelados e nevados invernos, o Sol, Brazão da Macedónia, soalheiro e amigo, aqueceu-me em abraços de boas vindas; no ar havia cheiros intensos de floras tipo mediterrânicas, que me alegraram a alma e fizeram sentir em casa.

Ali, a Polícia da ONU facilitou-me viatura e intérprete e, no dia seguinte, fui em busca do tal Macedónio, residente algures, fora da cidade.

Um terço da população macedónia é albanesa, gentes curiosas, física e mentalmente perdidas na evolução entre Neandertais e Sapiens; vivem de pequenos negócios e “Cosas Nostras” várias, e são aliados naturais do Ocidente, pela excelência dos valores que seguem; gente fina!

Os que vivem em moradias rodeiam-nas de altos muros, para que não se lhes cobicem as mulheres, são muçulmanos, só casam entre si e, sendo elas pouco favorecidas pela mãe natureza, usam de nascença uma como que  burka natural de encantos nenhuns feita, não precisavam dos muros, mas enfim !

“Chegámos”, disse a intérprete; olhei, a modos que estranhado, pois, lá no cume duma colina estava plantada uma vivenda meia fortificada, colina essa rodeada de redes altas encimadas em farpados arames, holofotes, câmaras vídeo, e outros apetrechos defensivos; a entrada era um portão de alta segurança, com guardas, identificámo-nos e entrámos.

O por mim procurado Macedónio, albanês de origem e profissão, transpirando energia, era um ser dominante das coisas e das circunstâncias, simpático, falador… e aquela sua residência, era afinal uma firma de venda de armamento e material de guerra, facto inesperado para mim mas, na previsão da guerra ali vir a acontecer, o albanês macedónio vendia já armamento militar para as futuras milícias do Kosovo, metralhadoras, pistolas, equipamentos, etc… que, orgulhoso me mostrou, tudo ali exibido à vista.

Vendo o espanto no meu olhar, disse-me representar armamento americano e alemão; nada de anómalo, há firmas deste tipo em vários Países, para fornecerem as suas forças armadas; não era o caso.

Sendo o café (Kafa) uma tradição inultrapassável, convidou-me, sentei-me e lá veio o por ali celebrado e bebido “turska kafa”, feito com café em pó, sem filtros, de que gosto; bebia-o com a minha avó nas minhas infâncias e adolescências rurais e beirãs.

Perguntei-lhe a quem e para quê vendia as armas, pois não havia  ali guerra, apenas uns incidentes inter étnicos menores; ao que me respondeu vagamente, que há-de haver guerras.

Ele gostava de falar, interessei-me, alimentei a conversa e lá me foi contando coisas novas para mim, coisas de espanto e de mal crer; saí dali mais tarde, confuso, a pensar : – “ Zé Luiz, és um provinciano!”

E o albanês contou-me, que homens vindos da estranja (agentes da CIA e de países da NATO) andavam por ali há muito a planear guerras e a botar contas a custos e lucros que estas iriam render em armamentos, na Macedónia e no Kosovo, (ambas as regiões ainda em paz); seriam bons negócios, disseram-lhe e, botou logo firma para o efeito, aquela onde eu me encontrava.

Inocente, perguntei: – “Planear as guerras, mas quais guerras, não há guerras nenhumas aqui na Macedónia, nem no Kosovo! E fizeram já as contas aos custos e  lucros, como?”

Passou em falso e disse-me receber as armas legalmente e que, uma hora depois de adquiridas podiam estar no Kosovo em segurança, idas só por terras de albaneses.

De cabeça formatada à ocidental, eu era um crente nas fantasilândias dos média, onde as guerras são sempre maldades anti humanidade de uns quaisquer ditadores, politicamente incorrectos, oportunamente vilanizados e, logo combatidos pelas bondades pró humanidade de outros líderes, paladinos incansáveis da defesa dos eternos valores ocidentais, oportunamente deificados e, politicamente correctos.

Lá me revelou em breves dizeres, meio a confidencialidades não ditas, mas insinuadas, o que ouviu contar do fabricar daquelas guerras futuras e respectivos negócios.

“Mas, e as baixas?” Perguntei eu… “Ah! Quanto às baixas, essas, são apenas gente, just people”, disse-me ele, com fria indiferença e tal como terá ouvido da boca dos seus amigos fabricantes de guerras.

Ouvi assim falar, pela primeira vez, de “fabricantes /planeadores de guerras” no terreno, assim como das baixas das guerras serem consideradas “apenas gente, just people” e mais dos negócios das cujas, em armamentos e diversos, serem friamente calculados, e tudo isto anos antes destas se iniciarem.

Sorriu-se, quando lhe disse não crer em semelhantes tais, ao que ripostou, ser tempo para mim, de sair das realidades mediáticas e entrar nas realidades reais, passe o pleonasmo.

Depois concluí que aquele albanês da Macedónia, tinha sido convidado ou contractado pelos serviços de informações ocidentais (fabricantes das guerras) para aquele efeito, facto que me omitiu.

Estava então ali, pelos vistos, em planeamento a guerra do Kosovo, que só iria ocorrer em 1996/99, (estávamos em 94) e os EUA, UK, NATO, etc… tinham já os seus agentes por ali a pré fabricarem-na.

O Kosovo, tinha uma maioria populacional de origem albanesa (60%), e situa-se na fronteira da Macedónia (País este onde 30% são também albaneses).

Os preparativos para aquela guerra implicavam, entre muitos outros aspectos, a instalação duma cadeia de apoio logístico para o então futuro Exército de Libertação do Kosovo (UÇK/KLA), na Albânia e na Macedónia, para abastecimento oportuno de armas e munições, etc.…; a sua firma era, pois, um elo dessa cadeia logística.

O Exército de Libertação do Kosovo foi uma criação dos EUA e dos Países NATO em geral, e foi por estes Países recrutado, treinado em campos militares na Hungria, organizado, armado, doutrinado e depois orientado operacionalmente no terreno contra os Sérvios, em cujo território e País se integrava o Kosovo.

No fim falámos também no caso que ali me levou; resolveu-se nas empatias geradas, e lá me fui, às voltas com a minha cabeça a questionar-me à laia de Shakespeare, na versão : – “Crer ou não Crer, eis a Questão”.

Foi uma lição de política real a que aquele macedónio, albanês étnico, me proporcionou, ao mostrar-me como, mais de 6 anos antes, os “fabricantes de guerras”, em nome das potências dominantes no globo, andavam já no terreno a “comprarem” políticos, partidos, gentes e agentes, a recrutarem milícias e a doutrinarem, manipularem e instruírem esses instrumentos das políticas internacionais, muitos talvez inocentes e até de boas fés, para avançarem, oportunamente, com o processo conducente, neste caso, à guerra do Kosovo, em tudo idêntico, no “modu faciendi”, às guerras posteriores da Síria, Líbia, agora Venezuela e etc..

Em 1997/1998, três anos depois desta ida a Skopje, feita a paz na Bósnia e Croácia , estava eu de novo ao serviço da ONU na Bósnia, tive então acesso a informação confidencial sobre a preparação em curso do Exército de Libertação do Kosovo na Hungria, estavam já américas e afins a ultimar os preparativos dessa guerra contra os Sérvios, e com esta prestes a sair da linha de montagem, como saiu, justificada em alegados “massacres de albaneses Kosovares, cometidos pelos Sérvios” sob mando do Presidente Slobodan Milosevic, isto, contra as “inocências” albanesas do Kosovo, tal qual o macedónio amigo, me tinha contado que seria, em 1994.

A confrontação militar no terreno foi provocada por um sem número de “false flag attacks”, ataques de bandeira falsa, executados por milícias albanesas do Exército de Libertação do Kosovo, que se fardavam, ora de polícias, ora de militares sérvios (bandeiras falsas) e, assim fardadas, chacinaram as suas gentes albanesas, em vários incidentes, aqui e ali, (o mais notório aconteceu em  Racak),  que  geraram enormes colunas de refugiados albaneses em fuga do Kosovo… com imagens mediáticas de cortar o coração, como era essencial, para comoção e manipulação internacional.

Paralelamente, os arsenais informacionais dos média internacionais, desenvolveram uma ofensiva planetária em massa, denunciando, repetitivamente até à exaustão, as “culpas agressoras” dos sérvios contra as vítimas albanesas do Kosovo, e insistiam nos justos direitos dos Kosovares à independência, por serem ali maioria e vítimas de mortes do seu País soberano, a Sérvia, pese embora o Kosovo ser o berço da Nação Sérvia e esta ali ter os seus mais sagrados monumentos ortodoxos e memórias únicas das suas origens e História.

Nas dezenas de massacres ocorridos, os sobreviventes alegavam sempre serem os Sérvios os assassinos, pelas fardas, língua, etc … e logo a comunidade internacional, enraivecida e cheia de justas causas, amplificadas e multiplicadas vezes sem conta pelos seus “mass média” internacionais, emitiu o seu grito de compaixão,  ajuda humanitária e justiça para o Kosovo : –

“Aqui d´El Rei, há que defender as vítimas Albanesas do Kosovo, contra os criminosos agressores Sérvios e contra o Ditador Milosevic e dar-lhes a Independência” e, logo avançou a NATO com incessantes bombardeamentos, em defesa dos elevados valores ocidentais e contra os crimes de guerra anti humanidade, do vilão de circunstância, o Presidente S. Milosevic, que mais tarde se suicidou, convenientemente, com excesso de medicamentos, na prisão, em Haia.

E a guerra cumpriu-se conforme os planos em 98/99; no fim, os americanos e a NATO ganharam a guerra contra a Sérvia, que foi um simples massacre, tal era desproporção incomensurável do potencial relativo de combate.

O Kosovo, hoje em dia, é uma esplendorosa base militar dos EUA, rodeada de albaneses por todos os lados, que serviram apenas para justificar a sua independência americana.

O “massacre” da NATO contra a Sérvia em 98/99, envolveu mais de mil aviões e mísseis de cruzeiro lançados de submarinos, quase todos dos EUA, contra os sérvios na Sérvia e no Kosovo, tendo destruído, heroicamente, todas as suas  infraestruturas militares e civis, fábricas, pontes, centrais e barragens hidroelétricas, hospitais, auto estradas, instalações militares e até a embaixada da China em Belgrado (por engano disseram), etc…

No final da guerra havia +/-15.000 mortos sérvios e uns quantos albaneses, que eram “apenas gente”, como dizia o meu amigo Macedónio; baixas dos EUA e NATO, zero.

A guerra rendeu uns milhões em armamentos americanos e alemães consumidos, e há-de render ainda mais, pois só foi feita metade da guerra, falta a unificação do Kosovo, em preparação, com a parte albanesa da Macedónia e com a própria Albânia, projecto dos EUA em hibernação, para executar oportunamente.

Não há guerras espontâneas, nem guerras puras em defesa de quaisquer valores ou causas sejam quais forem, humanitárias, políticas, direitos humanos ou outras, isso, são apenas máscaras e utopias; todas as guerras são provocadas e pré planeadas, por razões concretas e terrenas, que o meu amigo circunstancial, o albanês da Macedónia… definia como “just business” de vendas e consumos de armamentos, controle de territórios estratégicos, apropriação e exploração dos recursos naturais das terras conquistadas, mas ditas libertadas dum qualquer vilão e ditador. (Gaddafi/ Líbia, Sadan Hussein/Iraque, Bashar Al Assad/ Síria, Milosevic/ Jugoslávia, Maduro/ Venezuela, etc…)

Nada de novo na História da Humanidade, as guerras foram sempre movidas por expansionismos territoriais, por razões estratégicas ou económicas, mascaradas de religiosas, ideológicas, interétnicas, e agora a última moda são as máscaras  humanitárias e de defesa de direitos humanos, como na Líbia, Síria, Kosovo; os vencedores, ontem e hoje,  exerceram e exercem sempre o direito cavernícola de saque de teres e haveres em recursos naturais e ouros em reserva dos perdedores e exercem os direitos de vida e morte sobre os malignos ditadores e agressores vencidos (hoje, executados pelo Tribunal de Haia, em formato de prisões e suicídios;  morreram na prisão de Haia dois Presidentes Sérvios, Milan Bábic da Krajina e Slobodan Milosevic da Sérvia, dizem que por suicídio.)

Quanto às baixas das guerras são e foram sempre (em toda a guerra da Jugoslávia morreram 140.000 pessoas) , neste caso e em todos os outros como dissemos, apenas gente, ninguéns e nada mais, no dizer e no crer de quem as fabrica e executa.

A guerra do Kosovo, foi pré planeada e levada à execução pelos EUA, NATO e Aliados, sem aprovação do Conselho de Segurança da ONU, consequentemente  contra a Carta da ONU e contra o Direito Internacional, foi fundamentada em razões humanitárias provocadas intencionalmente para o efeito, e  teve os seguintes objectivos :-

1º Reduzir ao máximo o território da Sérvia, por esta ser tida como hostil ao mundo Ocidental e ser pró Rússia;

2º Criar ali um território independente, sem viabilidade político económica, dependente dos EUA e da UE, assumido hoje como proctetorado internacional, situado mesmo no coração dos Balcãs;

3º Instalar no Kosovo, uma super Base Militar dos EUA, estrategicamente situada nos Balcãs, como está;

4º Ser um  território a integrar, oportunamente, na Grande Albânia, juntamente com a parte albanesa da Macedónia e ainda as partes muçulmanas da actual Sérvia, (Novi Pazar e St Jacques)

5º Criar um precedente para justificar novas agressões militares e guerras futuras e a haver mundo fora, desde que haja para o efeito a aprovação duma qualquer Coligação Internacional de vários e relevantes Países, contornando assim a Carta da ONU, guerras essas fundamentadas apenas em alegadas razões Humanitárias e, ou na defesa dos direitos humanos desses Países, desde que possuam uma posição geoestratégica importante, ou recursos naturais significativos de interesse para a tal coligação.

Assim vai o Mundo com novas guerras a desenvolverem-se no Irão, no Mar do Sul da China, Venezuela, etc…

A Paz é hoje o maior inimigo, combatido sem tréguas, pelos donos da Velha Ordem Mundial ainda em funções e, a ser já substituída por uma Nova Ordem Mundial mas,  tanto uma como outra vivem e viverão sempre de e para a guerra, a  actividade político e económico financeira preferida e a mais lucrativa das elites globalistas,  Senhores das mesmas.

A Paz é e será sempre uma Utopia, e cada vez mais!